Informe n.º 627


Marãiwatsedé: Fazendeiros bloqueiam estrada

Inconformado com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que no último dia 10 reconheceu ao povo Xavante o direito de retornar à sua terra original, Marãiwatsedé, um grupo de fazendeiros e políticos da região de São Félix do Araguaia, no Mato Grosso, fechou ontem à tarde a rodovia BR-158 que dá acesso à terra indígena.

Liderado pelo atual prefeito, Mario César Barbosa, de Alto da Boa Vista – município onde se localiza parte da terra Xavante – e pelo fazendeiro Dagmar Falheiros, candidato à prefeitura da mesma cidade, o grupo exige a saída dos índios e critica a atuação da Prelazia de São Félix do Araguaia, da Fundação Nacional do Índio (Funai) e de ONG’s de defesa dos direitos indígenas.

O momento escolhido para o fechamento da rodovia não é casual. Ainda ontem os Xavante foram visitados por uma comitiva liderada pelo Relator Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente, Jean-Pierre Leroy. Com a barricada erguida na BR-158, a comitiva foi impedida de seguir viagem, que tem como roteiro visitas a grupos de atingidos por barragens, no município de Chapada dos Guimarães.

A visita do relator tem apoio do programa de voluntários da Organização das Nações Unidas (ONU). Jean-Pierre Leroy recebeu dos Xavante denúncias de violações de direitos humanos que servirão de base para o relatório anual da ONU.

Segundo a administração da Funai na região, as maiores dificuldades enfrentadas pelos Xavante após o retorno a Marãiwatsedé são falta de comida, as poucas condições para o plantio e a reconstrução da aldeia. “Apesar da reconquista da terra, falta praticamente tudo. Este é um cenário de terra arrasada”, afirmou Leroy, concordando com a avaliação da Funai.

Além de denunciar as péssimas condições em que a comunidade vive hoje, o cacique Damião Xavante anunciou durante a reunião com o relator a decisão do seu povo de não abrir mão dos 20 mil hectares da terra indígena, ainda ocupados pelos invasores, e denunciou: “destruíram a nossa mata, acabaram com a nossa terra”.

O povo Xavante foi deportado da terra Marãiwatsedé em aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) em 1966, quando a terra passou a ser explorada pelo fazendeiro Ariosto da Riva. Ao longo destes 38 anos, a terra mudou de proprietários, até que em 1992 o Estado brasileiro reconheceu a ocupação tradicional indígena sobre o local.

Para D. Dedro Casaldáliga, concessões e acordos preocupam

Apesar da vitória parcial dos Xavante no STF, os precedentes de concessões e acordos sobre as terras indígenas feitos entre latifundiários e o Governo Brasileiro é considerado por Dom Pedro Casaldáliga, Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia e um dos principais apoiadores históricos da luta dos povos indígenas, como a maior preocupação neste momento.

“Vendo a diminuição da terra indígena Baú, do povo Kayapó, no Pará e conhecendo a maneira como o governo trata a homologação da terra indígena Raposa / Serra do Sol, imagino que qualquer defensor da causa indígena se sinta muito preocupado com a maneira como a questão indígena vem sendo tratada pela política indigenista oficial”, afirma D. Pedro.

D. Pedro considera a decisão do STF sobre a terra Marãiwatsedé “salomônica”, pois permite a volta dos índios, mas não ordena a saída dos invasores, sem resolver de maneira definitiva o problema mais imediato, que é o conflito.

Por outro lado, a força econômica e política dos grupos antiindígenas preocupa D. Pedro, que denuncia que está a se “fazer negociação às custas dos direitos indígenas, no fim acaba sempre sendo a política de concessão ao latifúndio”.

Para o bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, na condução da política indigenista oficial os interesses econômicos não deveriam se sobrepor ao direito constitucional dos índios. Contudo, essa situação vem ocorrendo “por causa da força do agronegócio. O agronegócio capitalista e neoliberal, que traz concentração de terra, poluição, veneno e desmatamento, é o inimigo número um dos povos indígenas. Porque os povos indígenas não são do negócio, não são das divisas financeiras, nem são da ‘produtividade’ capitalista. Por isso, a gente se sente com bastante receio frente à política indigenista oficial”.

Brasília, 19 de agosto de 2004. Cimi - Conselho Indigenista Missionário


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