Informe n.º 613


Sem novidades, indígenas saem pouco satisfeitos da audiência com Lula

“Não vou dizer que estou satisfeito porque ainda não foi a data marcada para homologar. Foram mais conversas sobre Raposa Serra do Sol. Muita conversa, mas na prática a gente não sai com o decreto de homologação. Eu tenho que acreditar que até o final deste mês seja resolvida a homologação. Se não for, aí é outro detalhe para começar a discutir. Vamos continuar lutando”, disse Jaci José de Sousa, Coordenador do Conselho Indígena de Roraima, após sair da audiência, no dia 10 maio, com o presidente da República.

Esta foi a primeira vez em 16 meses de governo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu as portas do Palácio do Planalto para ouvir as reivindicações do movimento indígena. O encontro foi fruto das pressões dos índios que acamparam, de 15 a 22 de abril, na Esplanada dos Ministérios. Participaram do encontro 25 lideranças indígenas representando 23 povos de todo o país.

A audiência não trouxe nenhuma novidade para os índios. No seu discurso, Lula pediu paciência e compreensão aos índios, conhecedores profundos do significado destas palavras, haja vista que são compreensivos e pacientes há 504 anos; garantiu que Raposa Serra do Sol será homologada, mas não disse a data e nem de que forma - informações importantes para as lideranças; enfim, disse que muito será feito, mas não informou como de fato será feito.

“Tínhamos a expectativa de que o governo fosse tomar atitudes concretas e urgentes no momento, como a homologação da terra Raposa Serra do Sol e isso não aconteceu. Não digo que estou satisfeito, a audiência mostrou que o movimento indígena tem que continuar unido senão, nós, povos indígenas, não teremos muita coisa do Governo Federal. Essa audiência mesmo foi fruto de nossas pressões, quando ficamos acampados em abril. Lula não nos atendeu porque quis. Nós fomos os últimos a ser ouvidos por ele”, disse o cacique Marcos Xukuru.

Raposa Serra do Sol - Na audiência o presidente garantiu que dentro de pouco tempo o governo tomará uma decisão definitiva sobre Raposa Serra do Sol e não quis dar prazos. Segundo ele, para evitar mais pressões. “Não quero dizer o tempo e a quantidade de dia que eu vou tomar a decisão para não sofrer uma pressão acirrada. A pressão sobre Raposa Serra do Sol não é uma pressão pequena, apenas do estado de Roraima ou das nações indígenas que lá estão; a pressão é uma coisa que envolve uma magnitude no cenário nacional e internacional”. Lula afirmou que a sua decisão beneficiará a todos e não disse se será conforme a portaria demarcatória 820/98 (em área contínua). “Essa decisão que vamos tomar, podem ficar certos, será uma decisão madura. E eu acho que não há por que as pessoas não entenderem ou até não gostarem da posição que nós vamos tomar; é por isso que ela está sendo demorada, porque não queremos fazer nada precipitado que nos traga mais dor de cabeça amanhã”.

Em documento de seis páginas entregue ao presidente, o movimento indígena cobra a efetivação plena de seus direitos reconhecidos pela Constituição Federal de 1988 e reivindica mudanças positivas, com ações afirmativas que demonstre o compromisso do Governo Federal com os povos indígenas.

Na pauta, seis temas traziam 42 reivindicações, entre elas, proteção integral ao povo Cinta Larga e a todos os povos que se encontram sob ameaças de qualquer natureza, criação de um novo órgão indigenista, regularização fundiária de todas as terras indígenas, saúde e educação diferenciada, diálogo constante do governo com as lideranças, retomada das discussões no Congresso Nacional sobre o Estatuto dos Povos Indígenas, posicionamento contrário do governo ès Propostas de Emenda è Constituição, que pretendem transferir a responsabilidade sobre demarcação de terra indígena ao Congresso Nacional, e a valorização de suas culturas.

Segundo o presidente, “o governo vai se debruçar em cima delas (reivindicações) e trabalhar de forma consistente para resolver estes problemas”. E pediu, por mais de três vezes, compreensão aos índios. “Eu gostaria que vocês compreendessem também que nós, do governo, não vamos medir nenhum esforço para fazer as coisas que têm que ser feitas”.

Para Julio Macuxi, representante do Conselho Indígena de Roraima, os índios já estão sendo compreensivos há muito tempo com o governo, o que falta mesmo são ações concretas para os povos indígenas. “Compreensão o presidente já tem do movimento indígena, agora ele precisa é acelerar os processos relativos a nós”.

Resposta contrária ès reivindicações dos índios

No dia seguinte è audiência das lideranças indígenas com o presidente Lula, o Ministro Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, General Jorge Armando Félix, criou, por intermédio da Portaria n.º 15/2004, o Grupo Técnico destinado a elaborar proposta de uma nova política indigenista, a Câmara de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Conselho de Governo. Neste grupo a participação dos índios e das entidades indigenistas não foi contemplada. O diálogo do governo federal com o movimento indígena foi justamente uma das reivindicações apresentadas ao presidente da República.

A iniciativa da criação partiu do Ministro Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, como Presidente da Câmara de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Conselho de Governo. Esta Câmara tem como finalidade “formular políticas públicas e diretrizes de matérias relacionadas com a área das relações exteriores e defesa nacional do Governo Federal, aprovar, promover a articulação e acompanhar a implementação dos programas e ações estabelecidos, no âmbito de ações cujo escopo ultrapasse a competência de um único Ministério, inclusive aquelas pertinentes a:...III – populações indígenas”.

O Grupo Técnico funcionará, no prazo de 60 dias, a partir de sua instalação, sob a coordenação do presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, indicado como representante titular do Ministério da Justiça. E, na sua ausência, o assessor do ministro da Justiça, Cláudio Luiz Beirão, coordenará o grupo.

Além do Ministério da Justiça, integram o Grupo, a Casa Civil, os ministérios da Defesa, das Relações Exteriores, da Educação, das Minas e Energia, do Planejamento, Orçamento e Gestão, os comandos militares da Marinha, Aeronáutica e Exército, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Polícia Federal, Funai e a Agência Brasileira de Inteligência. No entanto, os ministérios da Saúde, do Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente, que têm ações diretas com os povos indígenas, foram excluídos da composição do Grupo.

Em documento entregue, no último dia 10, ao Presidente da República, o movimento indígena reivindicou: “Queremos um verdadeiro diálogo interétnico e a participação indígena nas instituições e políticas públicas e apoio do Governo Federal a uma legislação indigenista nos termos da Constituição de 1988”.

Para o Cimi a participação ampla dos povos indígenas, de suas organizações e das entidades indigenistas, na formulação da política indigenista é necessária e imprescindível. Com a atual composição, o Cimi não acredita que este Grupo Técnico seja capaz de propor uma nova política indigenista que atenda ès reais demandas dos povos indígenas.

Brasília, 13 de maio de 2004
Cimi - Conselho Indigenista Missionário




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