Informe n.º 591


Enfim, Assinada Portaria Declaratória da Terra Cantagalo

Depois de meses de pressão, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, assinou a portaria declaratória da terra indígena Cantagalo do povo Guarani. A assinatura ocorreu ontem (26) no auditório da Funai e contou com a presença dos ministros da Justiça, Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto, das Cidades, Olívio Dutra, presidente da Funai e lideranças indígenas. A terra Cantagalo tem 286 hectares onde vivem cerca de 170 pessoas e fica nos municípios de Viamão e Porto Alegre no Rio Grande do Sul.

Durante a solenidade, o presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, disse estar emocionado e alegre com a primeira visita do ministro da Justiça à Funai. "Isto marca uma nova etapa da Funai". Mércio afirmou que este foi o início de seu trabalho com o povo Guarani e que em 2004 eles serão prioridade para a Funai. Sobre a demora para assinatura da portaria o presidente atribuiu ao "desnorteamento da Funai" antes de sua gestão e que o governo estava "cauteloso" com determinadas ações.

O ministro da Justiça considerou o evento como um ato simbólico de mudança nas ações norteadoras do governo acerca dos assuntos indígenas. "Os votos do governo Lula são de mudanças e transformação da sociedade brasileira. Queremos a democracia de massa, onde todos os excluídos tenham acesso aos bens naturais da vida, dentre eles os povos indígenas. Que este ato simbólico seja um passo na busca destas mudanças". Ao final de seu discurso, disse que a intenção do governo é que "no final desse mandato todos as terras indígenas estejam demarcadas e homologadas".

Os processos que antecediam a assinatura já estavam concluídos há dois anos no Ministério da Justiça. Em junho deste ano, quando mais de 50 lideranças dos povos Guarani, Kaingang e Xokleng, dos estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná, estiveram acampados na Esplanada dos Ministérios, a assinatura desta portaria era uma das reivindicações.

Na ocasião do acampamento, um ofício do Ministério da Justiça, datado em 2 de julho, foi entregue às lideranças com prazos para a conclusão do processo de quatro terras da região Sul do país que aguardam a assinatura de portaria. Para Cantagalo, 30 dias foi o período estipulado pelo Ministério. Quase cinco meses depois, após muitas pressões de lideranças que estiveram em Brasília, foi assinada a portaria.

Das quatro terras reivindicadas duas já tiveram suas portarias assinadas, La Klaño dos Xokleng e Cantagalo dos Guarani. As outras duas, Palmas e Toldo Imbu do povo Kaingang, ainda estão paradas no Ministério da Justiça aguardando um desfecho. Para estas também foram estipulados prazos para a conclusão do processo que não foram cumpridos, 90 e 40 dias, respectivamente.

Para as lideranças indígenas mesmo depois de tanto esperar, esta conquista foi uma vitória. "A gente luta há mais de 30 anos por essa terra. Agora vamos ter mais espaço para plantar e viver em nossa terra. Foi uma vitória", disse o cacique Afonso da Costa.

Operadores do Direito Discutem Questão Indígena

Motivada pela necessidade de garantir um tratamento especial e adequado aos povos indígenas, a Advocacia Geral da União (AGU), em conjunto com o Ministério da Justiça e Ministério Público Federal, promoveu na última terça-feira (25) o "Seminário Sobre Questões Indígenas". O seminário contou com a participação do Advogado Geral da União, ministro Álvaro Augusto Ribeiro Costa, de advogados, procuradores, antropólogos, estudantes e lideranças indígenas.

"O Brasil não está preparado para conversar com os povos indígenas e respeitar os seus direitos. O Brasil velho está preparado apenas para a idéia de integração dos índios", disse Domingos Barreto Tukano, representante da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), que expôs sobre a situação dos povos indígenas. Barreto afirma que muitas coisas têm que mudar, principalmente nas questões relacionadas à terra como a demarcação e na construção de uma política indigenista articulada com os povos indígenas. "O movimento indígena está proposto a ajudar a construir um novo Brasil", concluiu.

O antropólogo e professor do Museu Nacional, João Pacheco de Oliveira, se incumbiu de esclarecer sobre o que é ser índio. Segundo ele preconceitos da época da colonização são latentes ainda no Brasil, não só em áreas específicas como o direito, mas em boa parte da sociedade. "É necessário ter uma nova representação do índio como sendo contemporâneo, atual e com futuro". Pacheco fez um apelo aos operadores do direito, presentes, para que eles façam estudos mais aprofundados em antropologia para poder atuar melhor com esta questão, que segundo ele "a questão indígena tem que ser tratada com paixão e lucidez"

A procuradora da República, Débora Duprat, abordou os preconceitos mais especificamente na área jurídica e considerou momentos como este seminário importantes para fundamentar a atuação do profissional do direito. Duprat ressaltou vários temas considerados por ela formas preconceituosas da justiça tratar os direitos dos povos indígenas. Segundo ela o Estado brasileiro em suas diversas instâncias, ou seja, executivo, legislativo e judiciário, vê os povos indígenas como incapazes de discutir os assuntos que os interessam, "eles atuam na antecipação, conhecem o outro melhor que eles mesmos. O Estado discute de si para si mesmo, não abre para ouvir as comunidades, acha que ouvir dois ou três índios é ouvir todos os indígenas", e alertou, "se nós não tivermos cuidado com isso, jamais vamos conseguir alcançar nossos objetivos".

Brasília, 27 de novembro de 2003
Cimi - Conselho Indigenista Missionário




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