Informe n.º 590


Iminência de Conflito na Terra Indígena do Povo Xavante em Mato Grosso

O conflito na terra indígena Mara-Watsédé no município de Alto da Boa Vista no Mato Grosso, a cerca de mil quilômetros de Cuiabá, entre o povo Xavante e invasores da terra indígena está cada vez mais preocupante. Desde a última quarta-feira (12) a iminência de um conflito maior é grande.

Mais de 400 índios estão acampados na estrada que dá acesso à terra. Do outro lado, invasores da terra, armados, impedem a passagem. Apenas uma ponte que foi derrubada divide os dois lados.

Ontem chegaram ao local mais 10 agentes da Polícia Federal, oito já tinham se deslocado na semana passada. O presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, também esteve ontem no local para conversar com os índios no intuito de evitar um conflito maior.

Segundo Edson Beirez, administrador da Funai em Goiânia, que está no local, a situação é muito tensa. Durante estes nove dias de acampamento os índios foram constantemente provocados pelos invasores. "Toda a mobilização dos invasores está sendo financiada pela prefeitura, transporte, comida e bebida, tudo". Beiriz afirma que fazendeiros da região com interesse na terra de 170 mil hectares, estão infiltrando seus pistoleiros entre os posseiros para causar mais tumulto. "Dos acampados do outro lado, a maioria não são posseiros, são jagunços de fazendeiros. Há muito interesse político e econômico em jogo", disse.

Em contrapartida as comunidades Xavante da região estão mobilizadas para ajudar. Muitos já se deslocaram para a área. "Minha preocupação é que com o clima de conflito e a chegada de mais índios, a situação fique sem controle", disse.

Os Xavante reivindicam a posse da terra que já foi homologada, restando apenas uma decisão do juiz da 5ª Vara da Justiça Federal de Cuiabá para efetivar a retirada dos posseiros e o retorno dos índios. Em 2001 a 5ª Vara da Justiça Federal de Cuiabá concedeu uma liminar aos posseiros determinando que continuem no local até o julgamento do mérito do processo.

No último dia 16 o juiz José Pires da Cunha, da 5º Vara, deu uma decisão que não atende aos interesses dos índios. Nela ele autoriza a entrada na área da Polícia Federal com apenas quatro índios para a fiscalização. "Os índios não aceitam esta decisão. Eles decidiram que só saem do acampamento se for para entrar na terra. Se o juiz não se posicionar vão permanecer no local acampados ou vão entrar na marra". Ontem (19) uma outra decisão do juiz determinou que a Polícia Federal faça o desarmamento no local. "Determino que seja realizado pela DPF a constatação da existência de porte ilegal de arma por parte dos ocupantes das terras indígenas, autorizado, para tanto, o ingresso da Polícia Federal nas casas localizadas na área".

Beiriz acredita que desarmar os posseiros é um das soluções para evitar um confronto, "outra solução seria fazer um esgotamento da área retirando quem não é posseiro", disse.

O clima é muito tenso e a população da cidade está sendo mobilizada contra os índios, legítimos donos da terra. Para o Cimi, desarmar os posseiros é um passo, mas não o decisivo. A terra já foi comprovada como tradicionalmente ocupada pelos índios, haja vista que já está homologada e registrada, sendo assim cabe à justiça não só julgar o mérito deste processo, como também garantir a posse e usufruto exclusivo da terra aos índios como garante a Constituição Federal.

Comissão de Direitos Humanos da Câmara Lança Relatório sobre a Situação dos Povos Indígenas no Brasil

Ao lançar no Congresso Nacional, na última terça-feira (18), o relatório da Caravana que percorreu áreas indígenas em situação de conflito em sete estados brasileiros, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Câmara Federal expôs o difícil momento porque passam os povos indígenas no Brasil.

O descaso e o desconhecimento com que o Estado trata a questão estão registrados ao longo de todo o documento e merecem destaque logo nos primeiros parágrafos do relatório. "Em diversos momentos a CDH foi desencorajada - por autoridades federais e estaduais - a empreender as visitas às aldeias sob o argumento de que os índios eram 'perigosos' e 'imprevisíveis'. Na verdade, estes argumentos escondem o fato de que a autoridade branca tem grande dificuldade em saber ouvir os povos indígenas", atesta o documento.

A Caravana realizada todos os anos com temáticas diferentes, também fez um mea culpa, ao reconhecer que a questão indígena nunca fora tratada pela CDH com a devida atenção. "As comunidades ficaram surpresas com nossa presença e afirmavam que nunca antes foram ouvidos como no caso desta Caravana", afirmou o deputado pelo PTB, Pastor Reinaldo, que participou da Caravana.

Orlando Fantazzini, deputado pelo PT e membro da comitiva, acredita que, apesar das dívidas históricas, este é um momento oportuno e propício para chamar a atenção para a questão indígena. "Mesmo sabendo que em sua carreira política Lula estabeleceu compromissos com os povos indígenas, sentimos que a política indigenista do governo está sendo deixada meio de lado", afirma o deputado.

O descumprimento da Constituição de 88, que determinou cinco anos para que todas as terras indígenas fossem demarcadas e homologadas no Brasil, e a ação indiscriminada de invasores nas áreas foram apontados como os motivos centrais das violências cometidas contra os índios.

Além de abordar os conflitos e a questão da terra, o relatório relata outros problemas enfrentados pelos indígenas como o preconceito, a degradação do meio ambiente, a falta de segurança, o atendimento médico precário e a ausência de uma política de educação diferenciada. Ao final do documento, o relatório faz recomendações às autoridades dos poderes legislativo, judiciário e executivo para que os direitos humanos e constitucionais dos povos indígenas sejam respeitados.

O deputado César Medeiros do PT lembrou que "se para os índios esta foi a oportunidade de fazer o seu grito de desabafo", cabe ao poder público e à sociedade envolvente "ouvir este alerta e ser solidário a estes povos, barrando o preconceito que existe".

Brasília, 20 de Novembro de 2003
Cimi - Conselho Indigenista Missionário




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