Informe n.º 566


Emenda considerada inconstitucional em votação no Senado

A proposta de Emenda à Constituição, número 38, do senador Mozarildo Cavalcante (PPS-RR), que volta à pauta de votação do Senado Federal no próximo dia 11, foi condenada por antropólogo, jurista e lideranças políticas.

A PEC que visa limitar o tamanho dos territórios indígenas e das unidades de conservação de forma que não ultrapassem, conjuntamente, 50 % da superfície de cada unidade da federação, e, além disso, transfere para o Senado Federal a responsabilidade de aprovar a demarcação das terras indígenas, foi considerada inconstitucional conforme se depreende pelas declarações a respeito.

A proposta teve o posicionamento contrário do líder do Governo no Senado, senador Aloizio Mercadante (PT-SP). Ontem (4), em audiência com lideranças indígenas dos povos, Kayapó, Xavante, Pankararu, Tupinambá, Fulni-ô e Maxakali e com os senadores João Capiberibe (PSB-AP), Fátima Cleide (PT-RO) e Sibá Machado (PT-AC), Mercadante, afirmou "o governo não apóia a aprovação da PEC, portanto ela não deve ser aprovada" ressaltou.

Proposta como esta que dispõe contra os direitos dos povos indígenas não deveria estar, pela terceira vez, na pauta de votação do Senado de um governo que tem um compromisso assumido com os povos indígenas, acrescentou, o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, "espero que o posicionamento do governo seja contrário efetivamente e que esta proposta saia do Senado de uma vez por todas" .

O jurista, professor Dalmo Dallari, analisou a proposta sob dois pontos, considerados por ele importantes. O primeiro, o fato da constitucionalidade. Segundo ele, projetos que tendem a reduzir direitos e garantias individuais, não podem ser objeto de deliberação constitucional, segundo o artigo 60º da Constituição, "esta emenda se encaixa neste contexto. Caso ela seja aprovada, pode-se pedir a anulação no Supremo por ser inconstitucional". O segundo aspecto abordado por Dallari é o da conveniência, onde fez duas analises. A primeira, da preservação ambiental, "desde o início os índios são os maiores preservadores ambientais" disse. Para ele, tirar as terras dos índios e entregar para empresas nacionais e multinacionais de mineração e extração de madeira, significa abrir as comportas para a destruição da natureza "os mineradores despejam mercúrio nos rios destruindo qualquer forma de vida o que jamais é feito pelos índios, e a extração de madeira significa a destruição da mata amazônica. Por isso, é importante para o Brasil que a terra fique com os índios". A segunda analise do professor é com relação à defesa de fronteiras "já se comprovou que os índios vigiam melhor que o Exército" e ressaltou "Portanto, por legalidade e conveniência, esta proposta não pode ser aprovada, porque levaria à matança dos índios e iria contra os interesses brasileiros; no sentido mais amplo iria contra os interesses da humanidade, na medida em que sua aprovação acarretaria gravíssimas agressões ao meio ambiente".

O professor concluiu sua análise afirmando que não há justificativas para que seja usada uma Proposta de Emenda à Constituição para benefícios individuais, "uma PEC não pode ser instrumento para proporcionar benefícios econômicos a meia dúzia de pessoas, sem qualquer comprometimento ético, causando graves prejuízos aos brasileiros".

João Pacheco, antropólogo e Professor Titular do Museu Nacional, considera que existem dois erros e preconceitos em relação à argumentação da proposta. O primeiro, o de arbitrariedade para o reconhecimento de direitos prescritos pela Constituição Federal. "O que define uma área indígena não é de maneira alguma a sua proporção com o tamanho da unidade da federação em que se localiza, mas sim o fato que se constitua de terras de ocupação tradicional pelos indígenas, necessárias à sobrevivência física e cultural das coletividades em que estão reunidos socialmente" afirmou Pacheco.

O segundo, é sobre a limitação de terra. Para ele, as terras indígenas estão longe de serem consideradas como latifúndios ou setores privilegiados "Na maior parte dos estados brasileiros, incluindo nordeste, leste e sul, indo do Rio Grande do Sul ao Ceará, as áreas indígenas correspondem a frações de alguns milésimos das terras desses estados. Os índios nessas regiões vivem em condição de pauperização, com terras reduzidas e com recursos ambientais devastados. Se na região amazônica os índios e as unidades de conservação ocupam parcelas significativas dos estados, isso decorre de fatores históricos, que permitiram uma presença indígena mais forte em termos demográficos, bem como da maior preservação da biodiversidade" .

O professor afirma que a PEC, ao invés de incorporar pontos positivos à política ambiental elaborada pelo governo brasileiro, colocada em prática nos últimos dez anos, continua a pensar o progresso econômico como em antagonismo frontal com os programas de desenvolvimento sustentável, colocando o Brasil na contra-corrente de todas as concepções modernas de ocupação de território e de uso dos recursos naturais, "esta proposta alinha a política brasileira com o pensamento mais conservador possível em matéria ambiental. Ao afirmar em seus pressupostos que desenvolvimento é sinônimo de devastação, a PEC de fato propõe aos legisladores que estabeleçam uma absurda e draconiana (50%!) cota de incentivo à destruição ambiental", concluiu.

A professora de filosofia da Universidade de São Paulo, Marilena Chauí, que em seus estudos e reflexões, acerca da cultura, acompanha a questão indígena, enfaticamente disse, "nem preciso me posicionar, eu acho está proposta é mais uma aberração, como sempre. Eu sou contra e ela não pode prosseguir".

O CIMI reafirma seu posicionamento de que essa proposta é uma clara sinalização contra os direitos constitucionais dos povos indígenas.

Brasília, 05 de Junho de 2003.
Cimi - Conselho Indigenista Missionário




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