Informe n.º 521


Pistoleiros matam mais um líder pataxó Hã-Hã-Hãe

Na madrugada desta quinta-feira, 18, pistoleiros comandados pelo fazendeiro Valdir Alves mataram a tiros o líder indígena Raimundo Sota, na fazenda Braço da Dúvida, região de Taquari, município de Pau Brasil, Bahia. A fazenda, invadida por Alves, havia sido retomada recentemente pelos índios Pataxó Hã-Hã-Hãe.

A morte de Raimundo Sota é mais um episódio sangrento na recente onda de agressões contra esse povo indígena. Em nota divulgada ontem, a equipe do Cimi de Itabuna denunciou que na manhã da última segunda-feira, 15, pistoleiros atacaram uma fazenda que havia sido retomada pelos Pataxó Hã-Hã-Hãe, na região do Ourinho, ferindo gravemente o índio José Carlos da Silva, 33 anos, com três tiros. José Carlos está internado no hospital geral da cidade de Camacã. Segundo os índios, os pistoleiros agiram a serviço do ex-prefeito de Pau Brasil, Durval Santana, que reivindica a fazenda como propriedade sua. Os pistoleiros continuam ocupando a área, que já havia sido atacada no ano passado com armas de grosso calibre e até bombas.

No início do ano, pistoleiros assassinaram com dois tiros o índio Milton Matos Silva, 44 anos, na frente de seu filho, dentro de uma área invadida pelo fazendeiro Joel Brito, também na região de Ourinho. No final de junho, pistoleiros liderados pelo fazendeiro Marcos Vinícius tomaram a cidade de Pau Brasil de assalto, passaram a exercer o papel de polícia e de justiça e promoveram atos de violência contra os Pataxó Hã-Hã-Hãe. Um lote de cacau que havia sido colhido pelos índios foi confiscado. Já no dia 4 de julho, jagunços comandados pelo mesmo Valdir Alves, responsável pelo assassinato de Raimundo Sota nesta quinta-feira, atacaram 25 famílias que haviam retomado uma área na região do Taquari.

Como os índios já vinham advertindo nas últimas semanas, a violência deverá aumentar ainda mais se as autoridades e a Justiça não agirem rapidamente, tanto para prender os assassinos e combater a impunidade que grassa no Sul da Bahia, como para garantir os direitos dos Pataxó Hã-Hã-Hãe às suas terras tradicionais.

Desde 1982, quando esse povo iniciou a luta pela reconquista de seu território, que abrange 53.400 hectares nos municípios de Pau Brasil e Itaju do Colônia, no Sul da Bahia, 15 de seus líderes já foram assassinados. O caso mais notório foi o de Galdino Jesus dos Santos, morto em Brasília em abril de 1997, quando acompanhava uma comitiva que foi à capital da República para buscar uma solução para os problemas de terra de seu povo.

Tramita no Supremo Tribunal Federal, desde 1982, uma ação para anular os títulos de propriedade que o governo baiano havia concedido aos fazendeiros. Diante, porém, da morosidade da Justiça, os Pataxó Hã-Hã-Hãe passaram a retomar por conta própria as fazendas ocupadas. No final de 1999, já haviam reconquistado quase 2.500 hectares. Em outubro do ano passado, reiniciaram as ações e reocuparam 60 fazendas, o que provocou a ira dos fazendeiros e o acirramento dos conflitos.

Esses conflitos, que tanto sangue tem custado aos índios, só serão resolvidos quando a Justiça deixar de ser omissa, anular os títulos de propriedade ilegais concedidos aos fazendeiros invasores e mandar retirá-los da terra indígena.

Enquanto não houver uma decisão por parte do Poder Judiciário, cabe ao governo federal garantir a integridade física do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, determinando a ida de contingente da Polícia Federal para dar proteção à comunidade e apurar os crimes praticados pelos fazendeiros.

Morre em Brasília o ex-cacique xavante Mário Juruna

Faleceu em Brasília, nesta quarta-feira, o ex-cacique xavante e ex-deputado federal Mário Juruna, 62 anos, em decorrência de complicações renais provocadas por diabetes e hipertensão. O ex-líder indígena está sendo velado no Salão Negro da Câmara dos Deputados e deverá ser enterrado na aldeia Namunkurá, no município de Barra do Garças, no Mato Grosso. Foi casado três vezes e teve 14 filhos.

Juruna foi uma das maiores expressões do movimento indígena brasileiro nas últimas três décadas. Ficou nacionalmente conhecido por registrar num gravador as conversas que mantinha com as autoridades governamentais e depois denunciá-las por fazer falsas promessas. Em 1980, depois de derrubar na Justiça a proibição de sair do país, presidiu o IV Tribunal Bertrand Russel, de Direitos Humanos, em Roterdam, na Holanda.

Em 1982, foi eleito deputado federal pelo PDT do Rio de Janeiro, tornando-se o primeiro índio a ocupar uma vaga no Congresso Nacional. Em resposta ao então ministro da Aeronáutica, Délio Jardim de Mattos, que havia criticado os cariocas por votar "nas tangas de um aculturado exótico", Juruna escreveu uma carta em que dizia que fora eleito com 80 mil votos e perguntava ao brigadeiro com quantos votos ele havia sido escolhido para ser ministro. "Gostaria de saber também se é da competência do seu ministério decidir ou opinar sobre os direitos políticos e civis dos índios", questionou, concluindo a carta com a afirmação de que fora eleito para "incomodar vocês" – isto é, os donos do poder.

Sua carreira parlamentar foi brilhante e marcada por polêmicas. Ocupou a primeira presidência da Comissão do Índio na Câmara dos Deputados. Em abril de 1983, entregou ao ministro do Interior, coronel Mário Andreazza, um documento, baseado no depoimento de 360 indigenistas e missionários, em que acusava a Funai de contrariar os interesses dos povos indígenas. Em setembro daquele ano, ao discursar em defesa do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, chamou o então general-presidente da República, João Batista Figueiredo, e seus ministros de "corruptos e ladrões". Por causa disso foi ameaçado de cassação, por falta de decoro parlamentar, em processo que não chegou a prosperar.

Apoiou a Emenda Dante de Oliveira, em favor do restabelecimento das eleições diretas para a Presidência da República, e denunciou o empresário Calim Eid por tentar suborná-lo para votar no candidato do regime militar, Paulo Maluf, no colégio eleitoral. Em abril de 1985, votou no candidato das oposições, Tancredo Neves.

Depois de cumprir o mandato, tentou se reeleger três vezes, sem sucesso, e tornou-se assessor da liderança do PDT na Câmara dos Deputados. Nos últimos anos, já muito adoentado e locomovendo-se numa cadeira de rodas, morava na cidade-satélite do Guará, no Distrito Federal.

Segundo afirmou o secretário executivo do Cimi, Egon Heck, com a sua morte "silencia uma das grandes figuras da luta indígena no Brasil. Silencia e deixa saudades também o seu legendário gravador".

Brasília, Brasília, 18 de julho de 2002.
Cimi - Conselho Indigenista Missionário




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