Informe n.º 533


Os índios e os resultados das eleições
Os índios e as urnas ou as urnas contra os índios?

Um fato doloroso, que chamou a atenção, foi a queda de um avião que levava dez urnas para as comunidades indígenas do Alto Rio Negro, no Amazonas. Seus cinco ocupantes morreram e as dez urnas eletrônicas foram perdidas. Ao olharmos para o quadro dos votos recebidos pelos 20 candidatos indígenas, um pouco mais de 13.000 ao todo, percebemos que eles representam apenas uma pequena percentagem dos eleitores indígenas do país, cerca de duzentos mil. Daí se poderia concluir que o "voto étnico", continua sendo mais um debate e uma aspiração do que uma realidade.

Se buscarmos identificar as causas desse desempenho globalmente pouco expressivo das votações dos candidatos indígenas, veremos que elas se devem a vários fatores. Dentre eles, vale destacar a relação histórica viciada da política partidária dentro das aldeias, o alto custo das campanhas, o descrédito na própria política partidária e a falta da exata compreensão do espaço de exercício do poder na sociedade não indígena.

Apesar desse quadro, é possível verificar um crescimento do interesse e da consciência do movimento indígena com relação à importância de sua participação nestas instâncias. Em 1998, tivemos apenas 14 candidatos indígenas. Nestas eleições, houve um aumento para 20. Esse número, embora não tenha uma grande expressão em si, revela a tendência de enfrentar o desafio das urnas, para ali levar as lutas e os direitos indígenas. O que o momento eleitoral e os resultados devem recolocar a todos os cidadãos deste país e, em especial, aos governantes, é a urgente necessidade de se rever a relação destes povos com o Estado e a sociedade nacional, possibilitando a eles uma participação com formas e canais próprios. Ou seja, como já existe em outros países, que lhes seja assegurada uma participação diferenciada no espaço legislativo.

Se, por um lado, nenhum índio foi eleito, os candidatos indígenas de partidos de esquerda conseguiram a maioria de votos (72%) e, certamente, a maioria dos votos indígenas terá sido para candidatos contrários à continuidade da atual política.

No estado do Acre, com a reeleição da senadora Marina Silva, houve a confirmação do seu suplente, o indígena Antônio Ferreira da Silva, do povo Apurinã. Abaixo, o quadro dos candidatos indígenas com a respectiva votação de cada um deles (fonte: Cimi e Tribunal Superior Eleitoral).

Candidatos indígenas ao cargo de Deputado Federal

Nome UF Povo Partido N.º Votos Amanuá Seus MT Kamayurá PMDB 1.504 Evilasio Pereira da Silva PE Fulni-ô PPS 487 José Adalberto Silva RR Macuxi PC do B 2.291 Total de votos: 4.282

Candidatos indígenas ao cargo de Deputado Estadual Nome UF Povo Partido N.º Votos José Osair Sales (Siã) AC Kaxinawá PV 742 Mario Karipuna AP Karipuna PSB 1.977 Francisco de Oliveira Lima DF Tabajara PSL 85 José Alírio Gomes Índio MG Aranã PMDB 396 Marta da Silva Vito MS Guarani-Kaiowá PT 1.462 Mariano Justino Marcos Terena MS Terena PST 237 Laércio Marques Pereira MS Terena PV 116 Lúcio Paiva Flores MT Terena PT 779 Tapiet Kayapó PA Kayapó PSB 309 Almir Narayamoga Suruí RO Suruí PV 577 Clóvis Ambrósio RR Wapixana PT 269 José França Miguel RR Makuxi PRTB 273 Gilberto Pedrosa Lima RR Makuxi PSD 37 Rodrigo Batista Pinto RR Makuxi PFL 341 Jonas de Souza Marcolino RR Makuxi PFL 703 Sebastião Bento da Silva RR Wapixana PFL 143 Gabriel Poti SC Guarani PPS 643 Total de votos: 9.089

Decreto inconstitucional contra os povos indígenas

Foi publicado na última terça-feira no Diário Oficial da União o Decreto 4.412, editado pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, que "dispõe sobre a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal nas terras indígenas e dá outras providências".

O governo FHC insiste em não observar o que dispõe a Constituição Federal quanto a nulidade dos atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse de terras indígenas. Mesmo sendo patrimônio da União estas terras são de posse permanente dos povos indígenas que nelas habitam.

O art. 3º do referido decreto prevê, que as Forças Armadas e a Polícia Federal poderão se envolver na "superação de eventuais situações de conflito ou tensão envolvendo índios ou grupos indígenas". Não é da competência desses órgãos a superação de conflitos interétnicos. O tratamento dessas questões é de competência da Funai, sendo que, somente em situações limite, o presidente do órgão poderá analisar este tipo de intervenção, não sendo necessário nenhum decreto.

O Cimi encaminhará representação ao Procurador Geral da República e ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil a fim de que seja providenciada a argüição de inconstitucionalidade dessas normas no Supremo Tribunal Federal.

É lamentável que, no apagar das luzes, este governo, numa clara demonstração de prepotência, ao invés de se empenhar para que a Constituição seja cumprida, proponha decretos inconstitucionais e, ao invés de buscar o diálogo com os povos indígenas, opte por expor esses povos a novas interferências que ameacem a sua sobrevivência física e cultural.

Brasília, 10 de outubro de 2002.
Cimi - Conselho Indigenista Missionário




.. volta para a página principal

Para mais detalhes com referencia ao texto, entre em contato diretamente com o Cimi:


Webmaster Pro REGENWALD

Gostaríamos a receber seus comentários e responder as suas dúvidas. Porfavor, mande sua messagem a se quisser contribuir a esse trabalho.